Minas Geral

Leo Gonçalves
2 min readMar 12, 2020

Se este estado não fosse propriedade das mineradoras e sim dos fabricantes de espadas e utensílios em metal, talvez se chamasse Forjas Gerais. Se não tivesse os fazendeiros na cumplicidade, talvez o nome fosse apenas Bigorna. Bem óbvio mesmo, descritivo. Se o estado não fosse uma constante tabula rasa, onde tudo se move para que possam perfurar mais a terra, talvez Minas Gerais tivesse algum nome indígena: Opará, talvez, que significa “Rio Mar” e é o antigo nome dado ao São Francisco pelos Xacriabá que viviam em suas margens. Talvez mesmo pudéssemos chamar este estado de Xacriabá. Ou quem sabe Araxá, “lugar de onde se vê o mundo”?

Mas não nos é dado ver o mundo. E por isso somos as Minas Gerais: este nome descrição. Para que serve aquela região? Para minerar, como o próprio nome diz. Assim como tem aquele Rio onde se pode nadar em Janeiro e aquela Bahia onde se pode pescar sempre que quiser. Nas Minas Gerais, o objetivo principal, é extrair minério do fundo da terra para nutrir o capitalismo mundial, como já foi com o ouro enviado para os britânicos no século XVIII, financiando, assim, a revolução industrial.

Não nos é dado ver o mundo. Nosso olhar é o de dentro da mina. Tudo escuro ao nosso redor. Não vemos uns aos outros. E quem deu notícia de que existe a luz do sol nalgum lugar, foi tratado com descrença, execrado ou chamado de lunático. A mina como uma caverna de Platão, lugar onde se disputa para definir a que ponto máximo você pode chegar: contanto que ninguém saia da sombra, contanto que ninguém saia da mina.

Não nos chamamos Abaeté (homem bom) porque vivemos numa sociedade fundada nos objetos. Especialmente nos objetos extraídos dos subsolos para se converter em dinheiro. Dinheiro para uns poucos. Uns poucos que podem simplesmente remanejar e eliminar (cancelar?) as pessoas que ocupam a superfície. A superfície da terra que pretendem cavar. Em Mariana, em Brumadinho ou na Serra da Piedade.

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Leo Gonçalves

Poeta, tradutor, ensaísta, performer, autor do livro de poemas Use o assento para flutuar, (Crisálida, 2018). Escreve no www.salamalandro.redezero.org.